terça-feira, 29 de setembro de 2015

DEUS AJUDA A QUEM CEDO MADRUGA

DEUS AJUDA A QUEM CEDO MADRUGA


                  Eustáquio
 29/09/2015



Caro leitor,

Com certeza, você já ouviu ou viu esse adágio popular que constitui o título deste artigo, não é mesmo? É muito comum as pessoas dizerem que Deus ajuda a quem cedo madruga! E aí, leitor, você concorda com essa “sabedoria” popular? É realmente uma verdade que Deus ajuda a quem cedo madruga?
Decidi fazer este artigo sobre o tema quando estava lendo o livro do jornalista Gonçalo Junior, intitulado “É uma pena não viver – uma biografia de Rubem Alves.” O livro é novo. Foi lançado agora, em junho, e trata da história de Rubem Alves. Você, leitor amigo, conhece Rubem Alves? Já ouviu alguém falar sobre ele? Já leu algum livro dele?
Caso você, leitor, não conheça nada acerca dele, permita-me, resumidamente, apresentá-lo. Rubem Alves nasceu, em 1933, na cidade Boa Esperança, situada no sul de Minas Gerais. Formou-se em Teologia pelo Seminário Presbiteriano do Sul, em Campinas, no estado de São Paulo. Depois fez mestrado e doutorado pelo Seminário Teológico de Princeton, nos Estados Unidos da América do Norte. Foi pastor protestante da Igreja Presbiteriana do Brasil. Além de teólogo, foi filósofo, psicanalista e escritor. Tempos depois, abandonou a religião. Faleceu em 2014, com 80 anos de idade.
Pois bem! Na página 125 do livro supracitado, está escrito:

“O ditado afirma que ‘Deus ajuda a quem cedo madruga’. Rubem madrugava, inutilmente, para ser pianista, porque certamente Deus não conhecia o tal ditado e não o ajudava. “Mas Deus amava Nelson de um jeito que não me amara. Aprendi que o ditado verdadeiro é: ‘Aqueles que Deus ama não precisam madrugar’.”

O teólogo Rubem Alves, como você, leitor, vê acima, era uma pessoa bastante crítica diante da ignorância humana. Para ele, o ditado “Deus ajuda a quem cedo madruga” era mais uma ignorância do homem. E o Rubem estava com toda razão, como vou mostrar facilmente neste artigo. No trecho acima, está dito que Rubem Alves adorava música. Seu maior sonho era ser um pianista. Todos os dias acordava cedo para tocar piano em sua própria casa. Acreditava no ditado popular “Deus ajuda a quem cedo madruga”. Todo seu esforço foi em vão. Num tom de humor, dizia que Deus não o ajudou a ser um pianista, apesar de madrugar todos os dias, porque a divindade não conhecia o tal ditado. Se Deus tivesse ciência do ditado, tê-lo-ia ajudado. E Rubem dizia que Deus amava o Nelson de um jeito que não me amara. O Nelson citado aí era um grande pianista que, obviamente, não madrugava. Mesmo assim, era um grande pianista.
E, repito, Rubem Alves tinha toda razão! O povo constrói adágios que nada têm a ver com a realidade. E aqui está um bom exemplo da infantilidade humana. O ditado “Deus ajuda a quem cedo madruga” não tem validade alguma, ou seja, não serve para nada. É mais uma fantasia, uma ilusão humana. Por quê? Ora, porque os deuses não existem. Logo, os deuses não ajudam a ninguém. Principalmente, não ajudam aqueles que madrugam, que acordam mais cedo. Essa ajuda divina é mais uma ilusão humana! E vou provar aqui, de forma clara e cristalina!
O primeiro exemplo é o do próprio Rubem Alves. Ele era um cristão que lia a Bíblia 24 horas por dia. Respirava a Bíblia. Frequentava a Igreja Presbiteriana do Brasil. Formou-se em Teologia. Depois fez mestrado e doutorado em Filosofia e Teologia nos EUA. Foi pastor. Um de seus sonhos era ser um grande pianista. Acordava todos os dias bem cedo para treinar piano. Madrugava, confiante no ditado popular de que “Deus ajuda a quem cedo madruga”. E dizia ele que, apesar de todo esse amor e dedicação a Deus, a divindade não o ajudou. Ele nunca foi um bom pianista. Entendeu, leitor, como realmente o ditado popular em exame é uma fantasia humana?
Veja, leitor, outro exemplo: milhões de brasileiros trabalham incansavelmente todos os dias, até mesmo sem folga alguma, de segunda a segunda. Essas pessoas acordam todos os dias de madrugada. Saem de casa, geralmente situada em bairros distantes do trabalho, pegam metrô, ônibus, trens etc. Chegam ao trabalho já cansadas. Retornam para casa, à noite, completamente liquidadas pelo cansaço. Não têm nem tempo de ver os filhos. Ganham um salário miserável. E, infelizmente, apesar de madrugarem todos os dias, sua vida sofrida e difícil nunca mudará. Ou seja, a ajuda de Deus não chega, não vem. Percebeu, leitor, como o adágio popular é infantil e falso? Todos os dias a gente vê filas e mais filas de pessoas sofridas e pobres à espera dos transportes coletivos, não é mesmo? Que sofrimento, não é mesmo? E essas pessoas pobres saíram de sua casa, de madrugada. E, lamentavelmente, a situação delas não melhora. Vão continuar morando distante do trabalho, ganhando um salário miserável, passando necessidade, sem ver os filhos, mesmo acordando de madrugada, mesmo levantando-se muito cedo.
A coisa é bem diferente, caro leitor, com os políticos. Por exemplo, deputados federais e senadores, aqui, em Brasília, não madrugam. Nenhum deputado federal ou senador acordam de madrugada para trabalhar. Nada disso. Eles acordam lá pelas 10 horas da manhã. E não ficam em filas de ônibus e metrô para se deslocarem ao trabalho, ao Congresso Nacional. Eles têm motorista e carro oficial. Ou seja, não gastam um tostão com o deslocamento até o seu trabalho. E trabalham apenas 3 dias na semana. Ou seja, deputados federais e senadores não madrugam, mas têm uma vida maravilhosa, com salários excelentes, carros oficiais e motorista pago com o dinheiro público, e patrimônio invejável. Será, leitor, que Deus inverteu o ditado popular, ou seja, está ajudando a quem não madruga?  Deus ajuda os deputados federais e senadores que não acordam de madrugada, e deixa de ajudar milhões de trabalhadores miseráveis que acordam de madrugada?
Percebeu, leitor, a infantilidade do ditado popular?


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