Eustáquio
Prezado
leitor,
Na
foto abaixo, uma das paredes laterais internas da maior penitenciária do
Distrito Federal, o CIR (Centro de Internamento e Reeducação), popularmente
conhecido por Papuda.
Precisamente
no dia 27 de novembro de 1985, quando eu estava com 29 anos de idade, tomei
posse, por meio de concurso público, no cargo de agente penitenciário do quadro
da Polícia Civil do Distrito Federal. Nesse dia, cheguei à penitenciária para o
primeiro dia de trabalho, e somente a deixei em janeiro de 1990, isto é,
trabalhei lá durante 5 anos. São muitos os fatos que vivenciei ali, e aproveito
a oportunidade para narrar um deles.
Eu
trabalhava em regime de plantão, 24 por 48 horas, ou seja, trabalhava um dia, e
folgava dois. Uma maravilha! Entrava às 9h de um dia, e saía às 9h do dia
seguinte. Naquela época, a Papuda estava com, aproximadamente, mil e duzentos
presos. A quase totalidade dos condenados ocupava cela privada, isto é, apenas
um preso em cada cela. Havia poucas celas coletivas, ou seja, celas com mais de
dois presos. Mesmo assim, não eram celas apertadas ou lotadas. As visitas de
familiares e amigos dos presos eram efetuadas somente aos domingos. A cada
domingo, por volta das 8h, ônibus chegavam lotados à penitenciária. Familiares
e amigos dos presos eram revistados e, após a revista, entravam no pátio.
Muitos presos faziam tendas no pátio, com paus e lençóis para terem uma certa
intimidade principalmente com as mulheres visitantes. Já outros presos não
possuíam tendas, razão pela qual, para fazerem sexo, utilizavam 6 quartos, cada
um com 1 banheiro, pelo tempo de apenas 30 minutos. O controle de acesso dos
presos aos quartos, obviamente, era feito pelos agentes penitenciários, e aí eu
me incluo. Nos domingos, um agente ficava com uma lista com os nomes dos presos
e das mulheres que iriam entrar nos quartos para fazerem sexo. Se um
determinado preso não estivesse relacionado na lista, não poderia entrar em um
dos quartos. Ou seja, não poderia fazer sexo com alguma mulher, mesmo que
estivesse matando cachorro a grito. Eu e outro colega de trabalho facilitávamos
a vida de alguns presos. Eu, por exemplo, permitia a entrada de presos aos
quartos, com suas companheiras maiores de 18 anos, mesmo que seus nomes não
estivessem na lista. E os presos sabiam disso. Por isso mesmo, eles me
adoravam. E eu, no fundo, não estava fazendo uma coisa ilegal, proibida. A
relação de nomes nas listas era apenas uma forma de organizar as entradas, e
nada mais. Por que eu permitia a entrada aos quartos de casais cujos nomes não
estavam na lista? Ora, por uma razão bem simples. Era muito comum, durante as
visitas, uma mulher visitante conhecer um preso e ter o desejo de fazer sexo
com ele. A mulher não conhecia o preso, e o preso também não a conhecia. É
óbvio que os nomes deles não constavam da lista. E aí eu permitia porque o
preso estava desesperado para dar uma trepada, e a relação sexual é relaxante.
Depois do gozo, o preso ficava feliz, calmo, sereno e com um sorriso radiante.
Passava por mim, e dizia:
---
Deus lhe pague, policial Lins!
Pois
bem, caro leitor! Havia presos que tinham esposa, namorada, amante. Em relação
a esses aí, não havia problema porque, todos os domingos, o sexo estava
garantido para eles. E os presos que não tinham esposa, amante e namorada,
iriam morrer na masturbação diária? No sexo solitário? Havia presos muito feios
e extremamente pobres que nada tinham a oferecer a algumas mulheres prostitutas
que apareciam lá. Lembro-me agora do preso com o apelido “Fumaça”. Ele ganhou
esse apelido porque era negro, muito negro, tipo o cantor Tony Tornado. Só que
Tony Tornado era lindo diante do “Fumaça”. O “Fumaça” é uma das criaturas mais
feias que vi ao longo dos meus 62 anos de idade. Ele gostava muito de mim. Num
domingo qualquer, uma prostituta estava acompanhando uma irmã de um preso.
Pense, caro leitor, numa prostituta feia! Pois essa era mais feia ainda! Mesmo
assim, ela não queria abrir as pernas para o “Fumaça”. Eu estava sentado, ao
lado da porta que dá acesso aos quartos. O “Fumaça”, batendo com sua mão
direita levemente sobre meu ombro esquerdo, foi logo falando:
---
Seu Lins, só o sinhô mermo pra me salvar. Arranjei uma muié aí, e meu nome não
tá lista, e ela tá me cobrando cinco real. Não tenho, seu Lins.
---
Não esquenta, “Fumaça”! Hoje, você vai gozar, meu amigo! Pegue aqui vinte reais
para você. Dê cinco à mulher e fique com os quinze. -- disse eu, retirando o
dinheiro de minha carteira.
Quatro
minutos depois, lá vem um dos casais mais feios que vi em toda minha vida: o
“Fumaça” e a prostituta. Entraram em um dos quartos, permanecendo ali por 30
minutos, o tempo máximo permitido. “Fumaça”, depois do sexo, era outro homem,
feio como sempre, mas com um largo sorriso estampado no rosto.
Caro
leitor, dei a este artigo o título “Caridade sexual na penitenciária”. Pois
bem! O “Fumaça” e alguns presos não tinham mulheres, não faziam sexo. Viviam se
masturbando. Ora, a masturbação não preenche o vazio deixado pela ausência de
sexo. Ninguém fica sorrindo depois de uma masturbação, mas fica radiante de
alegria depois de fazer sexo com alguém. Para resolver o problema de presos
feios, muito pobres e sem companheira, apareceu naquela época na penitenciária
uma mulher idosa, com aproximadamente 65 anos de idade, feia que dói, com
apenas 1 dente podre no meio da arcada dentária superior e cadeirante, numa
cadeira de rodas. Aquela mulher paraplégica, grudada para sempre numa cadeira
de rodas, idosa, feia e pobre, realizou, de graça, sem cobrar um tostão, o
sonho de muitos presos. O “Fumaça” agora tinha uma mulher para fazer sexo. Como
aquela cadeirante adorava fazer sexo! Em meus plantões de domingo, aparecia o
“Fumaça”, empurrando a cadeira de rodas sobre a qual estava a caridosa idosa,
com destino às maravilhas do sexo. Quando o “Fumaça”, depois do sexo, trazia a
idosa, imediatamente outro preso lascado pegava-a de novo, e lá vai a idosa
sendo conduzida para novo abate. Aquela mulher adorava fazer sexo! Eu ria muito
porque a idosa transava num domingo com uns 15 presos, e não exigia um tostão.
Fazia aquilo por caridade, por caridade sexual! Que mulher fantástica! Um poço
de bondade, de amabilidade, de fraternidade! Até então, em minha vida, eu tinha
visto várias modalidades de caridade (doação em dinheiro, por meio de roupas,
emprego etc.), porém nunca tinha visto caridade por meio de sexo. Nunca tinha
presenciado uma mulher fazer sexo com homens somente para aliviá-los, somente
preocupada com a realização sexual deles. Nunca me esquecerei da bondade
daquela idosa com apenas 1 dente podre, solitário, na arcada dentária superior.
Em
janeiro de 1990, depois de 5 anos de trabalho na inesquecível Papuda, saí para
assumir outro cargo em outro órgão. O “Fumaça” ficou, e a cadeirante idosa
continuou indo todos os domingos. Depois de 2 anos após minha saída, voltei à
penitenciária, num sábado, para visitar os amigos. Almocei com eles lá, em
nosso farto restaurante gratuito. O “Fumaça” já estava livre, nas ruas.
Perguntei a meus colegas se a cadeirante que adorava fazer sexo ainda
frequentava aos domingos a penitenciária. Eles me disseram que ela havia
falecido há uns 4 meses e que muitos presos choraram sua morte. A Papuda chorou
quando a idosa desdentada faleceu. E não era para menos, caro leitor!
Aquela
mulher merecia uma estátua de bronze na frente da Papuda.
Nenhum comentário:
Postar um comentário