quarta-feira, 4 de abril de 2012

ROBERTO MATOU SEU IRMÃO GERALDO POR SOLIDARIEDADE

Ontem, domingo, dia 14, à noite, minha esposa me chamou para que eu assistisse a uma matéria do programa televisivo Domingo Espetacular, apresentado pelo Paulo Henrique Amorim. Soltei temporariamente um bom livro e passei a ver a manchete.
Em outubro passado, na pequena cidade de Rio Claro, no estado de São Paulo, Geraldo Rodrigues de Oliveira, 23 anos, tetraplégico, foi assassinado com dois tiros em sua cadeira de rodas, dentro de sua casa. Quem o matou foi o seu próprio irmão Roberto Rodrigues de Oliveira, 22 anos.
Por que Roberto disparou dois tiros fatais em seu irmão Geraldo? Ora, Roberto matou seu irmão a pedido dele.
Há muito tempo que Geraldo estava numa cadeira de rodas, tetraplégico, em virtude de um acidente automobilístico. Ao ficar eternamente sentado em uma cadeira de rodas, casado e pai de um filhinho, o pobre Geraldo perdeu o sentido da vida. Para não se tornar um peso para sua esposa, saiu de casa, deixando-a com o seu querido filho. Foi morar com o irmão Roberto. Geraldo, todos os dias, pedia que o seu irmão o matasse. Roberto, com dó do sofrimento atroz do irmão, mudava de assunto, procurando acalmá-lo. Porém, Geraldo não mudava o disco. Todos os dias, implorava por sua morte. Pressionado pelo sofrimento do irmão, Roberto, com muito custo, resolveu atender o seu pedido. Meteu 2 balas no corpo inerte do irmão. E semana passada foi preso porque a polícia descobriu que ele praticou a eutanásia. E espero que ele hoje já esteja solto.
Já escrevi muito acerca da eutanásia. Sou totalmente a favor de sua prática. Infelizmente, neste país marcado pelo atraso, corrupção e impunidade, a eutanásia não é permitida. Dessa forma, o pobre Roberto vai responder por homicídio doloso, o que é na lógica um autêntico absurdo. Ao contrário, ele deveria receber uma medalha por ter praticado esse ato de solidariedade humana. O jogador de futebol Ronaldinho Gaúcho recebeu uma medalha da Academia Brasileira de Letras. Não merecia. Já o Roberto Rodrigues de Oliveira merece!
O Geraldo, amigo leitor, já não vivia. Vida para ele significava vida real: fazer amor com sua esposa, correr com seu filhinho, caminhar pelas ruas, urinar e cagar num vaso sanitário, vestir sozinho suas roupas etc. Por causa de sua eterna paralisia, não podia mais fazer as coisas mencionadas acima. Ele se sentia um trapo, um verme, morrendo lentamente. Para que, então, prolongar esse sofrimento sem fim?
Veja bem, caro leitor! A vida do Geraldo pertencia a quem? Ora, de acordo com a própria legislação brasileira, a vida de uma pessoa só pertence a ela, e a ninguém mais. Ora, se a vida de uma pessoa pertence apenas a ela, e a ninguém mais, conclui-se, pois, que uma pessoa pode dispor de sua vida a qualquer momento. Isso é lógico! Tanto é lógico que uma pessoa pode se suicidar quando bem entender. E, à luz da própria legislação brasileira, uma pessoa que tentou se matar, ou seja, tentou praticar suicídio, não pode ser punida. Isto é, não existe no Brasil punição alguma que possa ser aplicada a uma pessoa que não conseguiu se suicidar. Por quê? Ora, porque a vida pertence à pessoa, e ela pode fazer o que quiser com ela. Se uma pessoa, por exemplo, se corta profundamente com uma faca, jamais poderá responder pelo crime de lesão corporal. Por quê? Porque o corpo é dela, e de ninguém mais.
Geraldo não queria mais viver. Ele queria morrer! Não podia se matar porque não conseguia mover seus braços. Se pudesse fazê-lo, não teria feito esse triste pedido ao seu irmão Roberto. Ele próprio teria praticado o suicídio. E hoje o Roberto não teria tido problema algum com a Justiça. Já que Geraldo não movia sequer os braços, Roberto apenas foi, na verdade, uma extensão dos braços de seu irmão. Ele amava Geraldo, mas sofria muito com a sua situação caótica. Levado por um sentimento de solidariedade e amor, matou o irmão. Na verdade, esse verbo “matar” não reproduz a realidade do fato. Matar significa tirar a vida de alguém que não quer morrer. E o caso aqui é bem diferente. Roberto, na pura acepção da palavra, não matou o seu irmão, apenas o livrou de um sofrimento cruel e bárbaro. Por que, então, punir Roberto?
Ora, a legislação brasileira pune quem pratica a eutanásia. Um absurdo atraso! Alguns países já não a proíbem mais. E a própria legislação brasileira, como já frisei em artigos, é completamente louca ao proibir a prática da eutanásia. Por quê? Porque, em casos mais graves em que uma pessoa não quer morrer, ela permite que um médico tire a vida daquele inocente. Por exemplo, quando uma mulher fica grávida em virtude de um estupro, a legislação brasileira autoriza um médico a tirar a vida do feto que se encontra em desenvolvimento no útero materno. Aquele ser inocente nada fez de errado. Não saiu ainda do útero. Ele quer viver também fora do útero. Porém, a lei brasileira o manda matar. Ora, cacete, se a lei permite que um ser inocente morra sem ter feito nada ilegal e um ser que realmente quer viver, com mais razão ainda deveria permitir que um médico matasse um ser humano adulto e consciente que quer morrer por causa de sofrimentos físicos. Isso é óbvio! Porém, a legislação brasileira nega loucamente a eutanásia, e agasalha loucamente a morte de um feto. Que loucura! Que ausência de lógica!
Roberto vai enfrentar o Tribunal do Júri, que é composto por cidadãos comuns. O Júri, pois, faz muita merda. E espero ardentemente que ele continue cagando muito para absolver o Roberto. Esse rapaz não pode ser condenado, apesar da legislação em vigor. Como eu gostaria de defendê-lo perante os bobos jurados! Sairia, com certeza, vitorioso!
Em homenagem ao Geraldo que deixou de sofrer, os primeiros versos de uma canção de Fernando Mendes: “Cadeira de rodas”.
“Sentada na porta em sua cadeira de rodas ficava
Seus olhos tão lindos
Sem ter alegrias
Tão tristes choravam
Mas quando eu passava
A sua tristeza chegava ao fim
Sua boca pequena no mesmo instante sorria pra mim...”

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