quarta-feira, 4 de abril de 2012

AS LAMENTAÇÕES DE UM CORNO BRASILIENSE

Olá!
Eu me chamo Cornélio da Silva. O que foi? Você não gostou do meu nome? Se não gostou, espere só para ver os nomes dos meus irmãos: Chinfronésia, Eustódio, Rigel, Alcebíades e Simplório. Como se vê, papai e mamãe não tiveram bom gosto na escolha dos nomes.
O meu nome surgiu da ideia louca de papai e mamãe. Papai, Hélio, pegou um pouquinho do nome dele, e mamãe, Coralina, fez também a mesma merda. O resultado tinha que ser catastrófico. E eu tenho muitos amigos com nomes esquisitos também porque seus pais loucos tiveram a mesma ideia. Infelizmente, neste mundo, os justos pagam pelos pecadores.
Por causa do meu nome, eu sofro desde a infância. Sempre fui chamado de corno. Apanhei muito na rua, mas também bati. Ah, como bati! Até em casa, quando papai brigava comigo, também me chamava de corno. Eu ficava caladinho porque filho não podia responder às agressões dos pais. Está escrito na Bíblia que filho desobediente, por ordem de Deus, deve ser morto por apedrejamento. Mamãe sempre me lembrava disso. E, ainda, por cima, ela me dizia que Deus é justo e misericordioso. E eu, coitado, tinha que engolir tudo a seco. Somente na minha adolescência, é que vim a descobrir a razão de o papai ter-me chamado sempre de corno. Na verdade, corno era ele. Mamãe o traía com o dono da padaria. Agora entendi porque lá em casa não faltavam pães finos, bolos confeitados e tortas. O desgraçado do “Seu” Olavo, dono da padaria, se deliciava nas carnes de mamãe, e mamãe se deliciava nos pães, doces, tortas e salgadinhos enviados gratuitamente lá pra casa. Papai, na época, não sabia de nada porque, dizem por aí, que o corno é o último a saber. E isso é uma grande verdade. Se eu soubesse há muito tempo que mamãe botava chifre na cabeça de papai, eu teria dito a ela que também está escrito na Bíblia que Deus manda matar por apedrejamento a mulher adúltera. Se eu tivesse dito isso a ela, com certeza teria levado uma grande surra.
Quando eu estava com 18 anos de idade, conheci uma garota linda. Por incrível que pareça, o nome dela era Cornélia Aparecida de Oliveira. Pelo nome, já se percebe qual seria o meu destino como casado. Um Cornélio casado com uma Cornélia só poderia esperar uma coisa: muito chifre. E foi isso o que aconteceu.
O nosso casamento foi lindo. Casamo-nos na Igreja Católica. A igreja estava lotada. Depois da cerimônia religiosa, houve a festa que foi realizada num grande clube de minha cidade. Papai era pobre, e mamãe, também. Adivinhe quem pagou toda a festa? O desgraçado do “Seu” Olavo, o cara que comia mamãe.
Cornélia, minha esposa, diante do padre, fez promessa eterna de fidelidade. Ah, safada! Não demorou nem 3 meses de casada. Meteu chifre em mim com o filho do “Seu” Olavo. Ou seja, a família Olavo metia o pau na minha família. Que destino cruel!
Lembro-me, com se fosse hoje, do dia em que eu vi minha esposa na cama com o Ricardo, filho do Olavo. Nunca me esquecerei daquele momento de intensa dor e desespero. Como dói a dor do chifre! Tenho a plena certeza de que dói mais do que a dor do parto. A dor do parto vem com alegria em razão do nascimento de uma criança. E a dor do chifre? Não há evidentemente alegria alguma. Só a dor. Foi num dia de sábado. Eu havia saído para o trabalho. Ao chegar, o meu chefe me dispensou porque havia faltado energia elétrica. Não havia como acessar os computadores. Retornei, então, para o meu lar. Durante o trajeto até minha casa, eu, muito feliz, pensava em sair com minha esposa para almoçar fora, numa churrascaria qualquer. Abri a porta, dirigindo-me ao nosso quarto de casal. Nem houve necessidade de me aproximar muito da porta do quarto. A uma distância considerável, eu já ouvia os gritinhos de prazer de minha esposa. Durante as minha relações sexuais com ela, nunca eu ouvi gritinhos tão apaixonantes e altos. Aproximei-me da porta e puder ver a coisa mais dolorosa do mundo. Aquilo foi uma facada bem no centro do meu coração. O Ricardo traçava gulosamente a minha esposa, a mulher que me prometeu fidelidade até a morte, diante de Deus e dos homens. Tudo conversa fiada. Os dois estavam tão loucos de prazer que não me viram. Naquele momento de desespero, só me veio à cabeça uma ideia: matar os dois. Saí dali bem devagar, em direção à cozinha. Abri uma das gavetas e peguei a maior faca disponível. Quando eu segurei o cabo da faca, parei para pensar. Pensei em muitas coisas. Naquele momento, eu já era um corno. Se eu resolvesse matar os dois, além de corno, seria também um presidiário, já que eu seria preso por ser um rapaz pobre. Esses dois fatores negativos pesaram muito em minha decisão. E, além do mais, pensei, eu não sou o único corno do mundo. Resolvi, então, deixar a faca onde eu a encontrei. Não retornei mais ao maldito quarto. Abri a porta e saí sem destino. Fiquei numa praça, sentado num banquinho, observando as criancinhas. Exatamente no horário do término do meu trabalho, resolvi retornar à minha casa para ver a reação de minha esposa. Quando abri a porta, ela veio para mim, toda alegre, com abraços e beijos. Nunca vi tanta cara de pau! Como o ser humano é falso! Ela percebeu que eu estava triste, profundamente abatido. Eu, com calma, a levei à mesa para uma conversa franca. Disse-lhe que havia visto tudo. Ela ficou branca como o Michael Jackson no final de sua carreira. Num mar torrencial de choros, pediu-me perdão, dizendo que agiu daquela forma num momento de fraqueza, por descontrole sexual. Eu, obviamente, não aceitei suas desculpas. As cenas que eu vi foram fortes demais para engolir aquele perdão fraco e anêmico. Peguei minhas roupas e meus livros e fui embora para nunca mais voltar.
Retornei à casa de meus pais. Conversei com meu pai, outro corno. Não tive iniciativa alguma para conversar com mamãe porque ela corneava o meu pai com o pai do Ricardo. Papai me abraçou com todas as forças. Naquele abraço, senti um apoio muito forte.
No dia seguinte, recebi uma notícia trágica. Cornélia, minha esposa traidora, havia praticado o suicídio. No dia anterior, quando eu acabei de sair de casa, ela, na cozinha, pegou uma faca e a enterrou em seu coração. Até hoje, não consigo entender o porquê daquela desgraça. Sei, no fundo, que minha esposa me amava, tanto é verdade que resolveu dar cabo à vida quando se sentiu abandonada por mim. Mas uma pergunta até hoje me maltrata: por que, então, ela me traiu?

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