Antes, porém, quero dizer a você, leitor, que estou com 64 anos de idade. Já vivi muito. Vivi mais que, por exemplo, Elvis Presley, que não passou dos 42 anos de idade. Com minha experiência de vida, afirmo com toda certeza uma coisa: somente em 2 momentos de minha vida tive o desprazer de ver montanhas de merda. Montanhas de bosta. E vivenciei essas 2 montanhas de bosta justamente em Sobral. No primeiro caso, com o sobralense Sr. Elói. No segundo caso, com meu irmão Nonato.
O SOBRALENSE SENHOR ELÓI
Meu pai (João Lopes Lins) faleceu em 1965, quando eu estava com apenas 9 anos de idade. Minha família morava numa casa alugada, na Avenida Boulevard Pedro II, hoje, Avenida Dr. Guarani, quase colada ao Arco de Nossa Senhora de Fátima. A casa não existe mais porque o professor Luciano Feijão determinou sua demolição para construir seu colégio. Várias casinhas foram demolidas, matando assim uma parte da história de Sobral. Após a morte de meu pai, os membros da família, morando naquela casa, eram: mamãe (Gerarda Lins), Graça, Aleuda, Nonato, Deca, João, Liduína, Elcias e eu. Além desses, o Zé Maria, irmão de criação. Minha irmã Célia já morava em Fortaleza. A casa era muito grande, com um quintal imenso. Naquela época, não havia rede de esgoto naquela avenida. No quintal de cada casa, existia uma fossa, um buraco imenso, que captava a merda e o mijo de todos os moradores. A fossa tinha capacidade para armazenar merda e mijo durante 2 anos. E aí era necessário abrir a fossa para a retirada da merda e do mijo, colocando-os em outro buraco existente também no quintal. Minha família era pobre. Quando a fossa estava lotada, mamãe chamava o Senhor Elói, que morava na rua paralela à nossa, a Rua Oriano Mendes. Lembro ainda mamãe dizendo para mim:
--- Eustáquio, vá ali chamar o Seu Elói para vir aqui, limpar a fossa!
Prontamente, eu saía de casa, correndo em direção à casa do Sr. Elói. Com minhas mãozinhas, segurava a grade de entrada da casa e gritava:
---- Seu Elói! Seu Elói! Seu Elói!
E o Sr. Elói aparecia rapidamente. E eu completava:
--- Mamãe mandou chamar o Senhor para limpar a fossa!
Meia hora depois, o Sr. Elói aparecia lá em casa, acompanhado por um jovem ajudante. Eles traziam dois grande baldes com duas cordas extensas. Eu, ainda uma criança, corria alegre para o quintal a fim de assistir ao trabalho dos dois. Minha mãe me dava um pano para que eu colocasse no nariz a fim de não sentir o fedor da merda e da urina acumuladas ao longo de 2 anos. Porém, não adiantava muito. Mesmo pressionando o pano contra meu nariz, a catinga era terrível. Mas eu não saía dali. O Sr. Elói quebrava a tampa de cimento da fossa. Eu olhava curioso para dentro e via aquele mar de bosta e de mijo. O fedor era tão grande que se estendia pela avenida. As pessoas passavam pela calçada com os dedos polegar e indicador pressionados sobre o nariz. O Sr. Elói passava creolina no corpo e, bastante corajoso, entrava naquela fossa lotada de merda e de urina. Eu só via a cabeça dele porque a bosta encostava quase em seu queixo. Que trabalho desgraçado! O ajudante passava o balde vazio para o Sr. Elói, e este o devolvia lotado de merda e de mijo. Aí então o ajudante levava aquela porcaria fedorenta para outro buraco. Quando não havia mais bosta e urina na fossa, Sr. Elói fazia com cimento outra tampa. Ele, obviamente, saía da fossa todo cagado. Seu ajudante pegava uma mangueira e jogava água sobre aquele corpo. O interessante, caro leitor, é que nunca vi o Sr. Elói doente, acamado. Jamais! Ele só morreu anos depois devido a uma queda de um telhado de uma casa. O pobrezinho despencou do telhado. Ficou alguns dias na Santa Casa de Misericórdia de Sobral, situada na Rua Coronel Albuquerque. Depois, faleceu. Essa foi a primeira vez que eu vivenciei uma montanha de merda e de mijo. Já a segunda vez, foi com meu irmão Nonato Lins, cujo relato narrarei agora.
O SOBRALENSE NONATO LINS
Em junho de 2017, há 4 anos e 2 meses, eu estava em Fortaleza para mais um mês de diversão. Eu ficava no apartamento em que minha irmã Liduína e meu irmão Nonato Lins moravam, na Avenida Sargento Hermínio, perto do Colégio Estadual Liceu do Ceará, onde cursei o 2º Grau. Nonato estava com 73 anos de idade. Ele queria muito ir a Sobral para rever o amigo dele, o Sr. Atebalde (pronúncia do Nonato). Eu resolvi então realizar esse sonho dele. Coloquei em meu carro a Liduína, o Nonato e a Lucy Freitas, uma amiga nossa que cuidava do Nonato. E chegamos a Sobral. Ficamos 4 dias ali, na casa de minha querida irmã Aleuda, localizada na Rua Padre Fialho, perto da Praça São João, onde está localizado o teatro com o mesmo nome. No primeiro dia, tudo beleza, sem problema algum. Fazia minhas longas caminhadas pelo centro da cidade (Praça São João, Praça Coluna da Hora, Beco do Cotovelo, Mercado Municipal, Colégio Estadual Dom José Tupinambá da Frota, Arco de Nossa Senhora de Fátima etc.). No segundo dia, tudo beleza. Coloquei meu irmão Nonato no carro para visitar o Sr. Atebalde, que está morando hoje com uma filha perto do Colégio Professor Arruda, localizado na Praça do Bosque (o Nonato pronuncia “box”). Ao chegar à casa do Sr. Atebalde, desci do carro, segurando com firmeza o braço direito do Nonato porque ele já estava andando com dificuldade. E foi muito bom o reencontro dos dois amigos. Conversaram durante 1 hora e meia. Depois, voltei com ele para a casa da Aleuda. Uma explicação importante: desde o primeiro dia de nossa chegada a Sobral, coloquei o Nonato e a Lucy Freitas, que cuidava dele, no “Hugo Plaza Hotel”, um bom hotel que fica na Rua Deputado João Deodato com a Rua Anahid Andrade, próximo à rodoviária da cidade. Coloquei os dois ali para que eles tivessem uma noite mais agradável. Só usavam o hotel para dormirem. Pela manhã, eu os buscava. E foi assim durante 3 dias. No terceiro dia, um problema. Nonato não estava bem. Por volta das 15h (3 da tarde), ele se encontrava sentado numa cadeira, na sala da casa de minha irmã Aleuda, assistindo a um programa de televisão. Eu estava no sofá, ao lado dele. Num certo momento, senti um fedor forte de merda. Perguntei ao Nonato:
--- Nonato, você cagou?
E ele, prontamente:
--- Nada! Caguei não!
Ora não! Nonato estava todo cagado! A merda mole e amarelada escorria pela cadeira de plástico, caindo sobre a cerâmica da sala. Minha irmã Aleuda correu para pegar um balde. Na sala, havia uma torneira, ao lado da porta. Eu, com força, levantei o Nonato da cadeira. Enquanto a Aleuda jogava água na bunda dele com um copo de alumínio, eu passava minha mão direita pela sua bunda e pelo ânus para limpeza total. Minha mão direita estava desprotegida, sem luva alguma. Mesmo lavando depois, minha mão ficou fedendo à bosta durante todo o dia. Nonato, então, tomou algum remédio e ficou quieto. À noite, fui deixar o Nonato e a sua ajudante Lucy Freitas no hotel. No fundo, eu já estava preocupado, em razão da caganeira ocorrida na parte da tarde. Voltei para a casa da Aleuda. Fui dormir por volta das 23h (11 da noite). O Vinícius, neto da Aleuda, morava com ela e estava estudando na mesa da cozinha até de madrugada. Mais ou menos à 1 hora da madrugada, Vinícius me acorda, dizendo:
--- Tio Eustáquio, a Lucy ligou do hotel desesperada. O tio Nonato tá passando mal.
Dei um salto da rede, e corri para o Hugo Plaza Hotel, no meu carro. O quarto, onde o Nonato e a Lucy Freitas estavam, era de primeira qualidade: ar-condicionado, rede, televisor, cama grande e linda, banheiro luxuoso etc. Ao abrir a porta do quarto, senti o fedor forte da merda. A Lucy me olhava desesperada, sem saber o que fazer. Eu, ao ver o Nonato todo cagado sobre aquela cama linda, caí na gargalhada. Ri muito! E a Lucy começou a rir também. Levantei o Nonato, enquanto Lucy puxava o lençol lotado de merda. Ela colocou o lençol sobre a linda pia do hotel. Levei o Nonato até o chuveiro. Depois, ele se deitou novamente na cama. Peguei meu carro e fui, de madrugada, à farmácia do Rodolfo que fica próxima do Mercado Municipal. Só havia dois funcionários ali. Disse a um deles:
--- Boa-noite, meu amigo! Rapaz, qual é o medicamento bom que você tem aí para um idoso com 73 anos que não para de cagar?
O atendente achou graça! Comprei o medicamento que ele me indicou. Chegando ao hotel, fiz o Nonato tomar uns dois comprimidos. Permaneci ali por 1 hora por precaução. Já que Nonato parou de cagar, então voltei para dormir. No quarto dia, eu e Liduína entramos no carro e fomos ao hotel para buscar Nonato e Lucy com destino a Fortaleza. Quando cheguei ao hotel, pensando que o Nonato estava em condições de viajar, quebrei a cara. O recepcionista me disse que ele estava muito mal. Subi ao quarto. E vi o Nonato todo cagado novamente. E quase inconsciente. A Lucy, sua ajudante, diante de tanta merda, pegou até a toalha que cobria uma pequena mesa. E colocou tudo sobre a pia. A pia estava lotada de panos contendo muita bosta. Era tanta merda que, num dado momento, Lucy queria até pegar a linda rede que estava armada. Na hora, eu lhe disse:
--- Não, Lucy, não faça essa desgraça! Não estrague essa pobre rede! Coitada, ela não merece esse terrível destino.
Lucy soltou uma gargalhada. Havia merda em todo o quarto, até mesmo na cabeceira da cama. Acho até que o Nonato entupiu toda a rede de esgoto de Sobral. Merda com aquela quantidade só mesmo a fossa de minha casa em Sobral com o Sr. Elói fazendo a limpeza. O Nonato, como eu já disse, estava quase inconsciente. Eu não tinha condições de tirá-lo dali. Eu disse à Lucy que iria arranjar alguém. Desci e resolvi logo pagar as diárias equivalentes a 3 dias. Eu disse ao recepcionista que iria buscar alguém para tirar o Nonato dali. Ao sair do hotel, na frente, vi uma oficina. Dentro, 4 jovens. Eu lhes disse:
--- Bom-dia, meus amigos! Estou precisando de 3 homens para pegar um idoso que está hospedado aqui, no hotel. Basta descer com ele e colocá-lo no meu carro que está ali. Dou cinquenta reais para cada um.
Quando eu disse que daria cinquenta reais para cada um, os 4 jovens brigavam entre si para ganhar o dinheiro. Então, os 3 subiram e trouxeram o Nonato para o carro. Paguei a eles, e ficaram muito felizes. E eu também. Levei o Nonato ao Hospital Dr. Estevam Ponte, um hospital público situado na Rua João Barbosa, ao lado de um trilho, próximo ao Arco de Nossa Senhora de Fátima. Um hospital simples, mas maravilhoso, muito eficiente. Desci do carro, pegando uma cadeira de rodas para o Nonato. Ele foi rapidamente encaminhado a uma médica. Entrei com ele no consultório. Dali, Nonato foi levado para outra sala, ficando deitado numa maca. Vieram o soro e os medicamentos. E o Nonato dormindo. Meu medo era que ele acordasse e cagasse ali. Se o Nonato resolvesse cagar naquele hospital, o vigilante da portaria seria o primeiro a correr para escapar do fedor. Ainda bem que o Nonato manteve seu ânus fechado. Deixei a Lucy e a Liduína na casa da Aleuda, e voltei para o hospital. Fiquei ao lado dele. Chegamos ao hospital por volta de 8h. Fiquei com ele até às 15h quando recebeu alta. Nonato estava normal. Enquanto eu estava ao lado do Nonato, as auxiliares de enfermagem se aproximavam de mim para conversar. Eu dizia a elas que era sobralense e que estava morando há muitos anos em Brasília. Uma delas olhou para o meu braço direito em que há uma tatuagem com o rosto de Elvis Presley, dizendo-me:
--- Nossa, você é fã mesmo de Elvis, hein! Também gosto muito dele, que homem lindo!
Muito bem! Às 15h, Nonato teve alta. Voltamos para a casa da Aleuda. No dia seguinte, retornamos a Fortaleza. Até hoje fico imaginando aquela pobre empregada do hotel chegando àquele quarto. Só encontrou ali merda, muita merda. Merda no colchão da cama, merda na cabeceira da cama, merda nos lençóis, merda na toalha da mesa e merda no banheiro.
Atualmente, quando vou à casa da Lucy Freitas, que mora quase ao lado de minha irmã Graça, ainda brinco com ela. Eu digo à Lucy, brincando, que o diretor do Hotel Hugo colocou um cartaz com os seguintes dizeres:
“O casal Nonato Lins e Lucy Freitas está proibido de entrar neste estabelecimento porque veio de Fortaleza apenas para cagar aqui.”
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