Esse é o 2º vídeo em que faço uma pequena análise acerca das afirmações do jornalista Alexandre Garcia, publicadas no jornal Correio Braziliense, quarta-feira passada, dia 25 de agosto do corrente ano, na página 3. Eis o trecho da matéria:
“O Supremo é o intérprete da Lei Básica. Ser intérprete não significa traduzir o inverso do que está escrito. Se está escrito que um deputado é inviolável por suas palavras, então significa que ele é inviolável por suas palavras. Se está escrito que é vedado todo e qualquer tipo de censura, é porque assim é. Se está escrito que é isenta de restrição a manifestação do pensamento, que a casa é o asilo inviolável, que o Ministério Público é essencial à função da Justiça, que é livre o exercício dos cultos, que há liberdade de locomoção, que o presidente condenado fica oito anos inabilitado para função pública, então é assim que tem que ser.”
O trecho inicial acima já foi analisado no primeiro vídeo. Veja, leitor, o segundo trecho de Alexandre Garcia:
“Se está escrito que é vedado todo e qualquer tipo de censura, é porque assim é. Se está escrito que é isenta de restrição a manifestação do pensamento (...) então é assim que tem que ser.”
Segundo o jornalista Alexandre Garcia, a Constituição Federal garante, sem restrição alguma, a liberdade de expressão. Diz ele que é proibido qualquer tipo de censura, que as pessoas podem falar ou escrever livremente o que quiserem, já que não podem sofrer punição alguma, em razão da garantia constitucional. Com todo respeito, Alexandre Garcia está mais perdido que cego em tiroteio, em favelas do Rio de Janeiro. Veja o que a Constituição traz no art. 5º, incisos IV e IX:
“IV - é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato.
IX - é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença.”
Muito bem! Alexandre Garcia lê os incisos acima, vê as palavras “independentemente de censura ou licença” e pensa erroneamente que as pessoas são livres para falarem ou escreverem o que bem entenderem sem risco algum de censura, licença e punição. Por que o jornalista erra? Erra por não conhecer a sistemática constitucional. Ora, não se pode levar em consideração apenas um artigo da Constituição, solto, isolado porque outros artigos podem entrar em colisão, em choque. Por isso, estuda-se a Constituição pelo meio sistemático, levando em consideração os artigos, comparando-os e evitando os choques. Veja, leitor, um artigo constitucional que entra em colisão com os artigos relativos à liberdade de expressão acima: art. 5º, inciso X:
“São invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação.”
Percebeu, leitor, como esse inciso da Constituição anula o direito à liberdade de expressão? Ele mostra que o direito à liberdade de expressão não é absoluto, como diz o jornalista Alexandre Garcia. Veja que o inciso diz que são invioláveis a honra e a imagem das pessoas. Assim, uma pessoa não pode violar com palavras ou escritos a honra e a imagem de outra pessoa. Eis o choque: o inciso IX diz que é livre a liberdade de expressão, independentemente de censura ou licença. Só que o inciso X diz coisa contrária, afirma que ninguém pode violar com palavras ou escritos a honra e a imagem das pessoas. Ou seja, a liberdade de expressão não é absoluta, sem limites. Uma pessoa é livre para se manifestar por palavras ou escritos, mas não é livre para se manifestar por palavras e escritos, atacando a imagem e a honra das pessoas porque estas são também protegidas pela Constituição. Entendeu, leitor?
Alexandre Garcia diz que é proibido todo e qualquer tipo de censura. Não, Alexandre Garcia! A Constituição não diz isso! Ao contrário, afirma que todos os direitos têm limites, não são ilimitados. A Constituição garante às pessoas o direito à sua honra, à sua imagem. Por exemplo, se o jornalista Alexandre Garcia, dentro de um shopping em Brasília, fazendo uso da palavra, agride a honra de uma mulher, gritando que ela é uma vagabunda, prostituta de última classe, ele será preso em flagrante e levado a uma delegacia para responder pelo crime de injúria, descrito no art. 140 do Código Penal Brasileiro. E mais: ele será condenado também no juízo cível, isto é, indenizará a mulher pelo dano moral que ela sofreu por causa das ofensas verbais dele. Alexandre Garcia poderia dizer que agiu assim no direito à liberdade de expressão? Nunca! Nunca! Ninguém pode invocar o direito à liberdade de expressão para cometer crimes descritos em leis.
No início deste mês, aqui, em Brasília, uma mulher branca estava fazendo suas caminhadas pela manhã. Num certo trecho, ela viu um homem de cor preta também caminhando. Quando chegou perto dele, gritou:
“Até macaco agora está fazendo caminhadas!”
E agora, leitor? Segundo o ponto de vista do jornalista Alexandre Garcia, aquela mulher falou, se expressou por palavras, que é um direito garantido pela Constituição. Ele diz que ela agiu no direito à liberdade de expressão, um direito que não pode sofrer restrição alguma, censura alguma. Engana-se, o nobre jornalista! Aquela mulher branca foi presa na hora, em flagrante, e conduzida a uma delegacia de polícia civil porque cometeu um crime por meio de palavras. Além disso, ela será condenada no cível a indenizar o homem de cor preta pelo dano moral causado à sua imagem.
É fácil ver que, por meio de palavras e escritos, alguém pode ofender alguém, pode cometer crimes. Se isso é uma realidade, uma verdade, então, o direito à liberdade de expressão não é absoluto, não é ilimitado.