domingo, 10 de janeiro de 2016
A BÍBLIA E O MILLÔR FERNANDES
Eustáquio
10/1/2016
Caro leitor,
Millôr Fernandes (1923-2012) foi humorista, desenhista, escritor, poeta, tradutor, dramaturgo, jornalista e outras coisas mais. Tinha um cérebro privilegiado, ou seja, usava-o para raciocinar, e não apenas para separar as orelhas, como muitos o fazem. Em seu maravilhoso livro “Millôr Definitivo --- A Bíblia do Caos, L&PM Pochet, 2002, página 56, entre outras coisas, escreve o seguinte:
“Se a Bíblia tivesse sido submetida aos críticos, todos teriam achado subliteratura sem pé nem cabeça. No princípio era a verba.”
O humor inteligente do Millôr Fernandes contagiava a todos. Veja acima, caro leitor, que ele criou a expressão “No princípio era a verba”, fazendo referência à passagem bíblica “No princípio era o Verbo”, contida no evangelho atribuído a João, capítulo 1, versículo 1. Qual o significado da palavra “verba” usada por ele? Dinheiro, caro leitor! Grana! E por que Millôr fez isso? Ora, porque ele, como era estudioso e muito inteligente, via às claras a exploração financeira praticada por líderes religiosos sobre os fiéis por meio de dízimos, ofertas e doações.
Millôr também afirma acima que, se a Bíblia tivesse sido submetida aos críticos, todos teriam encontrado nela subliteratura sem pé, nem cabeça. E não só em relação à Bíblia, mas também em outros livros religiosos. Millôr faleceu em 2012, portanto, há 4 anos. Assim, em sua época, ele já sabia acerca dos estudos críticos acerca da Bíblia. No fundo, ele faz alusão ao passado em que ninguém podia criticá-la. Ou seja, no mundo antigo, quando a Igreja Católica Apostólica Romana dava as cartas, jamais alguém ousaria criticar a Bíblia, duvidar dela. Como exemplos, veja os casos de Giordano Bruno (1548-1600) e de Galileu Galilei (1564-1642). Havia até a expressão latina “Roma locuta, causa finita”. Ou seja, o Vaticano falou, então a causa está terminada. Não há mais o que discutir. E ai daquele que ousar contrariar a Bíblia. Giordano Bruno, coitado, foi assado vivo numa fogueira. Por pouco, Galileu Galilei não teve o mesmo fim. Só escapou da fogueira, porque foi obrigado a dizer que sua teoria heliocêntrica estava errada, mesmo sabendo que ela estava correta. Triste e hedionda época, não é mesmo, caro leitor?
Hoje, a coisa não funciona assim. O mundo evoluiu. E o mundo ocidental mais ainda. Brasil, França, Estados Unidos da América do Norte, a própria Itália, Canadá, Portugal e Espanha são provas dessa evolução. Reina a liberdade de crença e reina também a liberdade de expressão. Atualmente, em faculdades sérias de teologia, são feitos estudos críticos acerca da Bíblia, mas os estudiosos não vão mais para as fogueiras “santas”.
Sabe-se hoje, por exemplo, que a Bíblia é um conjunto de livros de caráter essencialmente religioso, e não histórico. Ou seja, mais lendas, mais mitos, mais alegorias, mais fábulas, mais hipérboles, que propriamente fato histórico. No fundo, como diz Millôr Fernandes, é “subliteratura sem pé nem cabeça”. Por que “sem pé nem cabeça?” Porque os relatos lendários bíblicos sepultam tudo aquilo que os crentes na Bíblia dizem sobre ela. Além disso, esses relatos são ingênuos, excessivamente infantis, frutos da imaginação de um povo que viveu há séculos num mundo marcado profundamente pela ignorância e analfabetismo.
Termino este artigo, com mais um humor de Millôr Fernandes. Veja, caro leitor, o epitáfio que ele criou para sua falecida esposa (brincadeira dele):
“AQUI JAZ MINHA MULHER
QUE PARTIU PARA O ALÉM.
AGORA ELA DESCANSA EM PAZ
E EU TAMBÉM.”
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